9.9.04

A morte pelo design

Ao poucos, pilares imperceptíveis da minha realidade vão sendo derrubados pela modernidade. Um deles está relacionado com as entranhas dos bancos de automóvel. Uma peça de Lego, ou uma moeda que desaparecesse naqueles buracos entre as costas e o assento sempre esteve, durante grande parte da minha vida, irremediavelmente perdida. De nada me serviu aquele conceito popular de que as coisas "não têm buracos". Atrás ou dentro dos bancos, o buraco não era condição necessária para o desaparecimento de objectos mais subtis.

Hoje, os designers que nos deixam rebater bancos de forma assimétrica, ou entrar num carro através de um sistema "easy entry", ensinaram-nos que os habitáculos têm de facto alguns buracos, mas que todos os eles podem estar (mais ou menos) ao nosso alcance. Com isto, entregaram-me nas mãos de uma ciência da utilidade, do prático, do conforto. Posso ter ficado uns cêntimos mais rico mas estas ridículas conquistas parecem tornar a vida incrivelmente deslavada. Tendo optado por arrumar Deus na prateleira da prostética, é nestas alturas que me interrogo se não seria preferível não o ter feito. Pelo menos enquanto espero por uma solução para esta súbita ausência de vazio.

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